sábado, 26 de abril de 2014

Viagem ao Centro-Oeste - Dia 6

Durante a noite pensei muito e percebi que o ônibus que só sairia às 23h chegaria em Alto Taquari por volta das 2h da manhã e a bicicleta estaria encaixotada. Não tem ônibus em outro horário.

O que vou fazer numa cidade pequena no meio da madrugada com duas mochilas e uma caixa gigante? Ficar na rodoviária? Como era a rodoviária? Seria seguro? Pegaria um táxi até um hotel próximo? Teria táxi a essa hora? Vaga no hotel? Hotel eu sabia que tinha mas era a única certeza.

Coloquei tudo na balança e o lado contra a continuação da viagem estava muito pesado. Tomei a decisão que era completamente contra ao que eu queria. Terminar a viagem por ali e seguir direto para a casa da minha irmã.

Com muita tristeza voltei a rodoviária e troquei a passagem para Rondonópolis. Apesar de triste sabia que me aliviaria muitas outras coisas e como, acho que já falei isso em outra ocasião, quando deixa de ficar divertido é melhor parar mesmo.

Abaixo a foto da escultura de um trator que fica em frente a rodoviária e que mostra a força do agro-negócio para a cidade.



Fui dar a boa notícia pra acalmar minha mãe (boa pelo menos pra ela) e ela já achou que tinha acontecido alguma coisa que eu não queria falar pra ela e ficou mais preocupada ainda... vai entender!

Levo boas lembranças dessa viagem que permitiu matar a saudade que eu tinha das paisagens, sons, cores e odores do interior que foi presente em uma parte da minha vida.






A rodoviária de Chapadão do Sul ficava a apenas 4 quarteirões do hotel que eu estava e mesmo assim tive que pegar um táxi.

Embarquei sem nenhum problema e no início da manhã acordava em Rondonópolis.

Meus pré-conceitos traduzidos em erros

No assunto bicicleta é fácil torcer o nariz ou gozar de algum apetrecho que num primeiro momento nos parece desnecessário ou apenas firulas.

Quando eu era criança achava demais tudo que pudesse deixar minha bici mais invocada como fitinhas coloridas penduradas no guidão, escovinhas nos cubos, pedacinhos de canudinhos nos raios, o famoso pedaço de pote de yakult ou tampa de manteiga raspando no pneu porque não tinha dinheiro pra comprar a manopla que emitia o som de moto acelerando.

O tempo foi passando e as coisinhas saindo até ficar exclusivamente o que vinha de original, talvez um ou outro adesivo e as vezes nem os originais resistiam.

Quando voltei a pedalar firme já com meus 27 anos de idade fui descobrindo devagar algumas coisas que hoje não consigo sair de casa sem, como capacete e luvas.

Me recusava a usar bermudinha de lycra que achava ser uma viadagem desnecessária. Com as pedaladas mais longas fui descobrindo em grandes assaduras que o selim que era o maior possível e quanto mais molas tivesse melhor, mais atrapalhava do que ajudava no rendimento.

Resolvi então colocar um banco mais fino, duro e sem molas, consequentemente a bermuda de lycra por ter uma parte acolchoada teve que ser incluída no pacote para tentar recuperar um pouco do conforto dos bancos de molas.

Hoje, pra não despertar os desejos sexuais dos pingaiados quando tenho que entrar em algum boteco de beira de estrada não uso mais as coladinhas de lycra mas sim as que são bermudas folgadas mas que tem forro almofadado como as que são vendidas na Decathlon e que ainda tem a opção de tirar o forro e você pode usar como short comum diminuindo assim a bagagem nas viagens.


Entrou nesse pacote o capacete e as luvas.

O primeiro capacete foi um usado que saiu num preço camarada. Apesar de ser um Specialized era grandalhão e feio. Hoje uso um Prowell que segura a bronca do dia-a-dia. E em dias de pedal mais longo vou de Giro Atmos que é bem mais leve.


As luvas inicialmente eram as mais baratas possíveis, depois foram aparecendo as luvas com gel e hoje normalmente uma vez por ano tenho que substituí-las. Se alguém souber de luvas resistentes por favor me avise!

Até hoje só usei luvas de dedo curto e em dias muito frios usava luvas de lã por baixo das luvas de ciclistas. Mas acabei de comprar luvas fechadas.

Me convenci que as camisetas de algodão aqueciam muito, além de segurar muito suor mas relutava em usar as camisetas de material sintético Dry-Fit porque eu não achava confortável mas me acostumei tanto que hoje tenho mais delas do que as de algodão no guarda-roupas.

São mais práticas de lavar, secar e nem precisam serem passadas além de mais leves e resistentes. A maioria que tenho me acompanham por anos e anos (é só reparar nas minhas fotos que várias delas são mas mesmas nas diferentes viagens em diferentes anos) e olha que uso cada uma delas praticamente uma vez por semana.

Não uso as camisetas específicas para ciclismo pois apesar de serem bem coloridas facilitando a visão dos motoristas e terem bolso nas costas limita o uso apenas para o pedal.

A posição na bicicleta também mudou, o banco subiu e melhorou muito o rendimento.

Por um tempo tentei usar o tal do firma-pé que basicamente é uma estrutura presa ao pedal que ajudar segurar o pé mas que o pé não fica grudado no pedal. Achava um absurdo gigantesco usar sapatilha que ficava presa ao pedal.

Este foi mais um erro que demorei anos e anos pra me convencer e hoje me arrependo profundamente ter perdido tantos anos sem usar. Faço de tudo pra convencer amigos que ainda teimam em não usar. Os que já me ouviram me agradecem.

É claro que nas primeiras pedaladas pelo menos um tombo é inevitável por isso a primeira vez que fui andar clipado peguei logo uma trilha, assim quando caí foi na terra e como acontece com a maioria das pessoas foi na hora de parar, então se cai parado o que não gera mais do que ralados no ego. Eu aconselho isso, quando colocar sapatilhas e pedal de clip vá andar em estradinhas de terra e pouco movimento para se acostumar.

Ah, aí sempre alguém pergunta: Mas e quando você cai, não fica preso? Não, na maioria das vezes não fica. Já tomei alguns rolas e somente em um fiquei com o pé preso e não foi nada que aumentasse os danos. 

Não é necessário também que você tenha que pensar pra fazer o movimento de livrar o pé, o que é impossível na fração de segundo que te separa do chão, mas pelos movimentos que involuntariamente você acaba fazendo.

Atualmente pedalo a maior parte do tempo em asfalto já que uso a bicicleta pra ir trabalhar e outra coisa que arrependo foi demorar tanto tempo em usar pneus slick (lisos) com 1.5 polegadas de largura.


Lia relatos que eram bons, diminuíam o atrito e via pessoas usando mas achava que em qualquer curva iria me ralar inteiro.

Não é bem assim não... isso acontece com pneus de cravos também.

Já usei os Kenda mas achei que desgastou rápido. Atualmente estou usando estes Panaracer modelo TServ que dizem ter a banda de rodagem com proteção anti-furo mas já consegui furar.


Depois de colocar senti a bike mais ligeira e ágil no trânsito além de um pouco mais leve e também me sinto seguro tanto no seco quanto no molhado.

Só não dá pra andar na terra mesmo e por isso optei por ter uma bike com pneus finos pra andar na cidade e outra com pneus cravudos pra fazer trilhas. Nas minhas viagens observo bem por onde vou passar e assim decido qual pneu usar. Quando fui pro Atacama usei pneus de cravo e quando fui pro Mato Grosso optei pelos slicks e não me arrependi. Se tiver certeza que só vai ter asfalto vou de slick sem dúvidas.

No quesito prevenção de furos ainda não tenho opinião formada sobre os selantes anti-furos, talvez seja mais um pré-conceito que algum dia eu quebre mas hoje me satisfaço com as fitas anti-furos mesmo. Já tive pneu furado pelo atrito da fita com a camara.




Mais uma coisa que gera discussões são os Bar-ends, aquelas barras perpendiculares que ficam nas pontas dos guidões que ajudam a variar a posição de segurar o guidão e consequentemente auxiliam prevenção ou diminuição das dores e dormências nas mãos e braços. 

Estou aguardando uma encomenda que é uma manopla com formato anatômica e tem um bar-end junto.


Uso o bar-end no dia-a-dia no asfalto e até arrisco se for pra longas distâncias em estradas de terra. Já usei nas trilhas mais radicais e já me enrosquei em cipós por isso não recomendo muito para estas situações.

Tenho bar-end um exclusivo pra usar nas viagens que é bem grande e além de permitir mais posições para as mãos ainda posso colocar nele o espelho retrovisor.


Por falar em retrovisor ainda é polêmico pra mim. Nas viagens por estradas asfaltadas é muito, muito útil, basta ler o relato da minha viagem pelo Centro-Oeste. No trânsito do dia-a-dia eventualmente sinto falta mas atrapalha ao passar pelos corredores. 

Já pensei nos que ficam presos no capacete mas tenho receio de em uma queda aquilo se transformar em uma lança perfurante. Já vi num site chinês um que é preso em uma munhequeira mas nunca vi ninguém usando pra perguntar sobre a funcionalidade.


Um acessório que se discute apenas o modelo ou a quantidade de funções é o velocímetro ou melhor dizendo, odômetro, que pode informar a distância, velocidade média, velocidade mais alta, hora, calorias, cadência, tempo da pedalada, distância total acumulada que auxilia na hora das manutenções mas também já li um relato de uma pessoa que se sentia preso as pressões de manter a regularidade e desligou o mesmo. Eu ainda uso e muito... quem sabe um dia decido desligar o meu também.

Outro acessório que me causava controvérsias, coisa de tiozinho, é o pezinho ou apoio. Pra mim hoje, no uso urbano e principalmente nas viagens que eventualmente simplesmente não se tem onde apoiar a bike, é indispensável.


Já tentou levantar uma bike carregada, cheia de alforjes? Quando fizer isso vai entender a necessidade do pezinho.

Ter um destes que permitem a regulagem de altura é bom pois quando você substitui o pneu por um maior ou menor, se consegue regular o angulo da bicicleta evitando que a mesma caia caso fique muito inclinada.

Outro acessório que demorei a usar e hoje não consigo esquecer são as faixas de cabeça ou bandanas. Ajuda a impedir que o suor escorra para os olhos ou respingue sobre os óculos.

Ah, os óculos! Vai fazer trilha? Então não pode faltar. Hoje é considerado um item de segurança porque ter uma folha de árvore ou um besouro dentro do olho quando se está a 30 ou 40km/h num single track é quase acidente na certa.

Uso inclusive em dias de chuva porque a água que o pneu joga no olho e vem misturada com óleo, gasolina e coisas que não temos como saber causam uma ardência indescritível!

Só uma dica: Óculos escuros são para se usar quando está sol ou claro. Óculos amarelos são para usar somente a noite porque essas cores claras favorecem a abertura da pupila e se você usar quando está sol vai prejudicar sua visão.

Ia esquecendo mas um, melhor dois, equipamentos que também não abro mão são as luzes, o farol e a lanterna. Fora do horário de verão às 18h quando saio do trabalho já está escuro e realmente não me sinto seguro em pedalar sem qualquer um destes dois itens. Em dias de chuva uso também quando está claro, os dois!

Já usei de vários preços e de algumas marcas e minha opinião não muda mais: Equipamento de qualidade é caro e é melhor investir logo em coisa boa do que ficar insistindo em equipamento de qualidade duvidosa.

Quando comecei a comprar coisas pra bike achava tudo muito caro e optava por comprar as coisas baratas pra pelo menos ter, no caso, um farol. E como foi triste vê-los voando do guidão e se espatifando pelo asfalto. Nessa história foram 3 de R$20,00 cada, ou seja, R$60,00, depois gastei mais R$100,00 pra comprar um Cateye.

Gosto da qualidade dos equipamentos da Cateye mas hoje estou usando farol da Planet Bike.



Por que fiz essa troca?

Farol na bike, salvo em trilhas no meio do mato, serve pra você ser visto e não pra você iluminar seu caminho. 

Os Cateye, e de outras marcas também, tem a indispensável função pisca-pisca. Digo indispensável porque chama muito mais atenção do que um simples ponto luminoso. 

É fácil perceber isto com pedestres que estão de costas pra você. Quando você vai se aproximando com o pisca ligado eles sentem "alguma coisa estranha" vindo por trás e muitas vezes olham pra trás pra ver o que é. Diferente quando é só um farol que não pisca.

Ainda não expliquei porque escolhi a Planet Bike e aí vai.

Quando meu Cateye, depois de alguns anos de uso, quebrou eu queria um farol que piscasse mais freneticamente e comecei uma peregrinação por várias, digo várias porque foram várias mesmo, bikeshops de Sampa e nenhuma tinha o farol que piscasse como eu queria. Em uma bikeshop famosa de SP a vendedora me olhou com ar de desprezo e disse: Nossa, não precisa piscar mais que isto!

Sabe de nada inocente!!! Mania besta dessas pessoas acharem que sabem de tudo. Talvez ela não pedale sozinha todas as noites como eu faço. 

Um belo dia, do nada passei sem querer pela estilosa (e caríssima!) Pedal Urbano que até então eu não conhecia e resolvi entrar pra ver. E lá fui apresentado ao poderoso Blaze One Watt da Planet Bike e foi paixão a primeira piscada. Custava o dobro do Cateye mas tinha que ser meu e não me arrependi.

Quando fui pra Nova York já tinha em mente que iria trazer outro pra deixar de reserva e mais um pra bike da minha mulher. E pra minha felicidade encontrei o modelo Blaze Two Watts e custando menos de 1/4 do que paguei em Sampa.

Se com 1 watt já era bom com 2 então é coisa de louco. Fico observando o reflexo do pisca em placas de trânsito ou olhos de gato de caminhão e numa distância de 300 metros pra mais já consigo ver o pisca funcionando. Mais um investimento que valeu a pena. 

Pra traseira não consegui encontrar um Planet Bike mas encontrei um que tem o mesmo pisca frenético, uma lanterna RadBot 1000:



E procurando esta imagem pra colocar no blog encontrei um excelente comparativo aqui e que o proprietário mostra o mesmo interesse que o meu no quesito iluminação.

Eu sempre falo que gostaria de andar como se fosse uma árvore de natal, sem exageros, segurança em primeiro lugar, e por isso estou pensando seriamente em adquirir os pinos luminosos que substituem as tampinhas dos pneus mas o trabalho de por e tirar todo dia ainda não deixou (a molecada do condomínio dá trabalho).



Esta postagem ficou maior do que eu imaginava que ficaria e ainda tenho sensação que não falei tudo então pode ser que ela seja atualizada futuramente.

O meu desejo é ter contribuído pra tirar o preconceito de pelo menos uma pessoa em pelo menos um dos itens que citei ajudando-a assim a pedalar de forma mais prazerosa ou segura. 

Não tenho intenção de dizer que alguma coisa é melhor que outra, apenas contar minha opinião sobre tudo o que já experimentei, o que funcionou pra mim pode não funcionar pra outra pessoa, assim como o vice-versa também é real.

quinta-feira, 24 de abril de 2014

Viagem ao Centro-Oeste - Dia 5


O frio ainda era companhia mas o Sol não estava escondido e sabia que logo marcaria sua presença.

Logo ao sair de Cassilândia vi uma grande escultura de um boiadeiro em uma rotatória mas não sei se foi construído errado ou de maneira proposital mas o mesmo não estava virado de forma que facilitasse sua visão por quem ia ou vinha na estrada, no meu caminho ele ficou de costas então não mereceu foto.

Acho que ele estava com vergonha da estrada que viria pela frente.

Não existia mais acostamento, era inicialmente uma rala camada de asfalto com não mais que 1 metro de largura mas que deixou de existir rapidamente.

Em alguns trechos o micro acostamento voltava a aparecer e era uma extensão da estrada o que era ótimo porque não havia desnível entre pista e acostamento e a qualidade também permitia manter uma boa velocidade, porém tudo que é bom dura pouco, muito pouco e logo a pista de rolagem disponível para a bicicleta era a faixa branca que também determinava o fim do asfalto.

Pedalar nessa situação no minimo não era legal ainda mais quando estamos em época de colheita e a estrada é dominada por caminhões, bi-trens e até treminhões com seus 8, 9 eixos.

Passava 50% do tempo olhando pra frente e 50% olhando pro retrovisor e quando via uma carreta a atenção era triplicada. Ficava olhando o retrovisor para ver se ela começava a desviar.

Quando vinham os comboios de duas, três, quatro carretas era possível que a primeira desviasse porém as que vinham atrás não teriam tempo pra fazer a mesma coisa e nesses casos preferia sair para a grama e tomar uma surra da ventania que elas causavam a ser despedaçado por alguma delas.

Tenho que dizer que a maioria dos caminhoneiros me respeitavam e desviavam passando até pela pista contraria. Apenas 1 mereceu o dedo médio prostrado pois jogou deliberadamente a carreta sobre mim naquela tal da fina educativa.

Não sei dizer se eram as condições precárias da estrada ou o condicionamento que chegava no seu ótimo mas a velocidade média subiu.

Encontrei uma lanchonete decente onde encontrei até Gatorade e salgados assados que também deram um gás na pedalada.

Na hora do almoço já tinha pedalado 70 dos 100km do percurso e encontrei um restaurante que foi o pior destes dias mas que matou minha fome.

Quando falo que parava em restaurantes para comer alguma coisa parece que eu contava com a sorte na hora de me alimentar mas não é bem assim, eu sempre tinha comida necessária para concluir o percurso proposto, apenas gostava de utilizar destes recursos.

O trecho era predominantemente de subida mas que eram leves e permitiam manter uma boa velocidade.

Uma destas longas subidas me levaram para a região do Chapadão que era mais plano e também predominavam plantações de algodão.


Pra mim uma novidade ver os imensos fardos de algodão enrolados como rocamboles gigantes.


Finalmente cheguei em Chapadão do Sul e na foto abaixo é possível ver o espaço que eu tinha pra pedalar (a faixa branca...)


Eu ainda estava no Mato Grosso do Sul e o plano seria seguir até Rondonópolis no Mato Grosso e daqui pra frente teria uma parte que por um lado me parecia ser a mais interessante e por outro seria a mais complicada.

A estrada me dava a opção de ir até Costa Rica, distante uns 70km de Chapadão do Sul e como, teoricamente, seria a parte mais plana eu faria rapidamente este trecho e depois deveria seguir para Alto Taquari já no Estado de Mato Grosso.

O problema eram as más recomendações que eu ouvi de parentes sobre este trecho, que teria uma grande parte de subida, que era deserto, que a estrada era ruim etc, etc e etc.

Uma estória a parte da viagem era a preocupação de minha mãe. 

Quando tenho as idéias de viajar de bicicleta pra algum canto minha mãe só ficava sabendo quando eu já estava de volta e como dessa vez eu tinha saído da casa dela, não tinha como esconder.

Não gostava nem um pouco de ter que ligar pra ela todos os dias (isso quando ela não ligava duas vezes ao dia) informando onde eu estava, se tinha comido, se tinha acontecido alguma coisa, que onde eu estava ou iria era perigoso, pedindo pra tomar cuidado e etc.

Um homem casado, independente, com 40 anos de idade ter que dar satisfações pra mãe me faz parecer que ainda não saí das fraldas.

Entendo a preocupação dela por eu, o caçula, entre outros 4 irmãos, ser o favorito, sem que ela nunca fizesse questão de esconder dos outros.

Pra mim pesava na parte psicológica, parecia que tinha alguém zicando a viagem, claro que ela queria que tudo corresse bem mas isso gerava um efeito contrário que me desestimulava muito.

Juntando isso com as péssimas condições da estrada que eu tinha enfrentado no dia anterior me faziam imaginar o que ainda estava por vir.

Assim decidi ir de ônibus até Alto Taquari e fui na rodoviária comprar a passagem, que só encontrei para o dia seguinte.

Novamente o problema de como carregar a bicicleta no ônibus.

Entrei em contato com a empresa de ônibus e me informaram que se a bicicleta estiver encaixotada não teria problemas.

Tá, agora o problema era arrumar uma caixa. Como tem muitas bicicletas pela cidade achei que não teria problemas em arrumar uma caixa em alguma bicicletaria.

Entrei na primeira que vi e que era bem simples e dois rapazes vieram me atender e comecei a falar quando eles fizeram sinais mostrando que eram surdos e mudos... apontei uma caixa mas pelo que entendi eles não poderiam me atender.

Ao lado encontrei o que até posso chamar de bikeshop mas não tive muita atenção do proprietário que pelo menos falou pra eu procurar na rua das lojas de móveis e pra lá rumei.

Entrei numa loja espaçosa e desta vez fui bem atendido por uma vendedora que me levou aos fundos da loja onde haviam várias caixas de vários tamanhos e falou que eu poderia pegar o que quisesse. Peguei uma de TV e uma de um fogão e lá estou eu carregando duas caixas gigantes pelas ruas.

Andei pela cidade e nos mercados achava estranho o fato das pessoas passarem suas compras pelos caixas e ficavam paradas aguardando a menina do caixa colocar as coisas nas sacolas.

Em Sampa você se vira... salvo quando algum mercado tem as pessoas que só fazem isso. Eu particularmente não acho correto a dupla função caixa/empacotadora e também principalmente não custa nada você agilizar e já ir guardando suas compras enquanto elas são passadas mas, cada lugar com sua mania. 

O que me deixou encanado mesmo foi o ar de superioridade das pessoas ali estáticas de braços cruzados como se dissessem: "Eu nunca vou me rebaixar a guardar minhas coisas na sacola".

Observei também outros comportamentos que não gostei muito (e olha que em Sampa tem muita gente mal educada) mas que vou guardar pra mim pois, poderia estar sendo leviano já que passei tão pouco tempo nesta cidade e o foco da história aqui é a pedalada.

Viagem ao Centro-Oeste - Dia 4


A previsão do tempo falou que o tempo ia virar e eu olhava pro céu estrelado e duvidava. No meio da noite uma forte chuva me acordou e pensei se seria viável o pedal amanhã e conclui que seria  mais fácil decidir quando visse o tempo pela manhã.

Quando acordei estava frio mas nem parecia que tinha chovido, bora pedalar então.



O céu estava nublado e ventava bastante o que dificultava bastante a pedalada.

Num determinado momento estava cansado da ventania e procurei uma área que ficasse protegido do vento frio e encontrei uma vala criada por um trator mas era suficiente pra desviar o vento e estiquei meu colchonete e deitei por alguns minutos.

Realmente não imaginava que iria passar frio no Centro-Oeste.

Ficava imaginando o que as pessoas que passavam na estrada pensavam quando viam um maluco estirado no meio do nada.

O sol apesar de estar encoberto pelas nuvens aquecia e deu uma aliviada no frio que fazia já que também estava protegido do vento.

Na topografia nada mudava, o sobe desce junto com a ventania fez a média horária cair bastante.

Em uma bela descida vi o que parecia ser um pouco de asfalto falho no acostamento e no mesmo momento vi no retrovisor uma carreta bitrem se aproximando e numa fração de segundo entrei no que na verdade era cascalho acumulado. 

Cascalho mais pneu fino mais velocidade e mais carreta em alta velocidade não é uma boa equação mas não tinha nada a fazer a não ser segurar firme, frear seria pior. 

Foi um momento muito intenso não ter o controle da bike enquanto era ultrapassado por aquela carreta monstro.

Fiquei imaginando como uma fração de segundo pode transformar a vida de uma pessoa.

Me distraia com as boiadas e era interessante ser observado atentamente por boa parte do rebanho como se eu fosse um vaqueiro ou ser nada comum e em alguns momentos eu até causava o estouro da boiada.


Muitos quilômetros depois estava novamente em uma descida e vi o que mais uma vez imaginei ser uma falha no asfalto do acostamento e sentia que estava correto porque a cor era a mesma do asfalto e diferente da situação passada mas como num replay da cena anterior não era e dessa vez o caminhão era menor porém a bicicleta rabeou mais forte do que da primeira vez e senti o pior acontecer.

Felizmente me livrei desta também mas a adrenalina foi a mil e prometi a mim mesmo que isto não aconteceria uma terceira vez.

O dia continuou sem nada interessante pra fotografar e então em uma subida passei por uma plaquinha no chão que era a letra de um funk atual que dizia: 


Andei alguns metros e me questionava se valeria a pena voltar e como não tinha tirado nenhuma foto resolvi que valeria a pena. Pra minha surpresa o verso da placa era mais interessante.


Parei em um bar na beira da estrada para comprar água e a mulher se assustou porque eu estava de bermuda e camiseta enquanto ela estava cheia de blusas e quando viu a bicicleta se surpreendeu mais ainda.

Mais alguns quilômetros a frente encontrei um restaurante de comida feita em fogão a lenha... Uma delícia.

Descansei um pouco e segui minha viagem e algum tempo depois um carro com caçamba parava a frente e imaginei as histórias que ouvia que assaltantes utilizavam esses carros pra levar as bikes de ciclistas em várias estradas ao redor de Sampa.

Pra meu alívio era o Fábio, um entusiasta do ciclismo que queria saber um pouco mais da minha viagem.

Já estava próximo de Cassilândia e as placas na estrada indicando hoteis são uma boa referência da região que deveria procurar então na praça central encontrei um hotel com preço justo e também podia contar com a infraestrutura da cidade.

Mais uma vez causei espanto nas atendentes que sempre vinham com a mesma pergunta: Tá pagando promessa?

Acho que é tão difícil aparecer um ciclista viajante por estas áreas que é justificavel esse espanto.

quarta-feira, 23 de abril de 2014

Viagem ao Centro-Oeste - Dia 3

Tive uma boa noite de sono só abalada pelo galo do vizinho que parecia ter invadido o quarto de tão alto que gritava e isso era umas 3 da manhã. Nem lembrava como galo cantava mas não vou esquecer por um bom tempo.

Sabia que a viagem começaria a exigir mais do meu preparo a partir de hoje e saí logo cedo, depois do café com direito a suco de laranja com beterraba e cenoura preparado pela Dona Ramisa.



Percebi que não gosto nada de despedidas e mesmo com pessoas que conheci a 1 dia não é uma coisa fácil de se fazer. Mais uma vez volto a agradecer ao Antônio e a Dona Ramisa pela estadia.


Saí de Santa Fé e logo avistei o imponente Rio Paraná e também a extensa ponte que teria que atravessar.


Sabia que era proibido atravessar de bicicleta mas dei uma de louco e fui seguindo e não vi ninguém com intenção de me deter e lá fui eu pelo cantinho da pista cruzar os 3.800 metros da ponte.




Foi uma sensação muito boa que senti enquanto olhava para a vastidão de água que passava por baixo de mim.


Logo saí da ponte e já estava em Mato Grosso do Sul e como num sonho que vira pesadelo a estrada fica horrível.


Horrível por um bom trecho até depois de Aparecida do Taboado,  terra da música que fala de um fulano que ficou 60 dias apaixonado, conheço a música mas não a letra.


Parei em uma barraca pra comprar água e alguma coisa pra comer e alguns caminhoneiros vieram com as perguntinhas básicas: De onde veio? Tá indo pra onde?

Quando falei que tinha saído de Votuporanga que era relativamente perto eles meio que deram risada da minha cara como se eu não tivesse ideia do que estava fazendo e a partir desse momento resolvi que iria mudar o discurso e aumentar um pouco a viagem pra não sofrer este tipo de situação que eu achei desmotivante.

Porra Poxa vem você aqui pedalar pra ver o que é bom alguém tirar barato da sua cara!!!

Depois de Aparecida do Taboado a estrada está sendo recapeada mas é de pista simples, pelo menos o acostamento é transitável para minha bike com pneu 1.5.

O sobe desce ainda faz parte da rotina e depois de um belo almoço feito em fogão a lenha em um restaurante na beira da estrada, o Sol que até então aparecia entre nuvens ficou forte no céu azul e mais um conhecido inconveniente fez questão de se juntar a equação, o vento contra.

Enquanto em São Paulo existem muitas placas indicando passagens de animais silvestres, aqui em MS estes pobres animais são vistos aos pedaços pela estrada, são corujas, tatus, cachorros do mato, tamanduás bandeira e alguns que não reconheci mas que não tiveram sorte ao cruzar a estrada.

Fiz várias paradas e com uma média horária muito baixa cheguei a Paranaíba.

Peguei um hotelzinho bem barato e nem vou sair pra dar uma volta na cidade.

Viagem ao Centro-Oeste - Dia 2


A pedalada seria curta até Santa Fé do Sul então enrolei um pouco no hotel, tomei café e saí.

O sobe e desce não acaba e eu ia me distraindo com os belos Ipês com suas flores cor-de-rosa e me divertindo com um grupo de perus que encontrei - acho muito engraçado o fato deles responderem quando a gente faz o glugluglugluglu.


Antes do meio dia chegava em Santa Fé do Sul e me surpreendi ao ver que a cidade é uma estância turística.


Logo encontrei a casa do meu novo amigo que fiz pelo couchsurfing, o Antonio e sua mãe Ramisa que me trataram hiper mega super bem.


Mandei alinhar a roda da bike que eu acho que desalinhou quando fui entrar com o carro na garagem da casa da minha mãe e ela que estava presa no suporte do engate e bateu no chão segundo meu sobrinho.

Depois disto comi o belo almoço preparado pela dona Ramisa, voltei pra pegar a bike e no final da tarde saí com o Antonio pra dar uma volta pela cidade que é bem ajeitadinha.

Mas segundo o Antônio não tem muitas opções de emprego por ser uma estância turística o que limita a instalação de indústrias na cidade.

domingo, 13 de abril de 2014

Viagem ao Centro-Oeste - Dia 1

O dia começou com temperaturas bem amenas e depois de 5km pedalando resolvi parar para tirar a blusa e passar protetor solar, foi quando avistei um outro ciclista se aproximando pela direção oposta a minha, era o José que também estava viajando de bike mas a única semelhança comigo era o fato de estarmos viajando sobre duas rodas.

Ele vinha em uma bike que mais parecia uma Caloi Ceci com cestinha na frente e tudo, mas que nem Caloi era, nem manopla tinha e sua bagagem consistia em algumas coisas na cestinha e mais uma mala de nylon, dessas quadradinhas, sobre a cesta.

Ele me contou que vinha de Campo Grande e estava indo para o Rio de Janeiro.

Me deu um pouco de confiança e também de apreenção porque se ele com toda aquela falta de estrutura já tinha feito quase a mesma distância da minha viagem e ainda pretendia fazer a mesma distância pra frente, quem seria eu pra desistir.

Contou que dormia sobre as pontes e que usava uma peixeira (que fez questão de me mostrar) pra se defender e que a polícia já lhe havia tirado várias delas dele mas que na próxima parada ele comprava outra.

Ele também estava preocupado porque sua garrafinha de pinga já se encontrava quase vazia. 

Queria saber como ele consegue. Eu gosto de tomar minha cervejinha mas sempre depois do pedal, porque durante acaba com o rendimento.

Depois disso só teve o sobe e desce constante, não lembro de nenhuma parte plana.

Mas eu estava justamente onde eu queria, no meio das paisagens sem fim que eu adorava.



Chegando em Jales encontrei um bom hotel ao lado da estrada:


Deu pra guardar a bike no quarto tranquilamente, todos os quartos são no térreo e com largos corredores o que facilitava muito entrar com a bicicleta.

Era domingo e saí pela cidade pra comer alguma coisa e só encontrava sorveterias abertas, várias delas, cheguei até a achar que a população só se alimentava de sorvetes.

Entrei em um botequinho e só tinha um pacote grande de banconzitos, então fui pagar e a menina do caixa que comia uma bela marmita ficou assustada com o valor do salgadinho (R$5,80), falei que foi a única coisa que tinha encontrado na cidade então ela me indicou uma lanchonete escondida umas ruas abaixo. Agradeci e devolvi o salgadinho na prateleira.

Cheguei na lanchonete e só iriam abrir daqui 1 hora e meia, fiz uma cara de piedade e a moça se comoveu e foi ligar a chapa.

Um belo X-Salada com uma coca-cola de 600 em garrafa de vidro, novidade pra quem mora em Sampa que só tem essa opção em garrafas de plástico.

Depois dessa caminhada ganhei uma bolha causada pela alça da minha havaiana e cheguei no hotel descalço.

É estranho andar pelo interior porque pela cara de curiosidade das pessoas parece que todo mundo sabe que você não é de lá.

Viagem pelo Centro-Oeste - Preparativos

Por que pedalar pelo Centro-Oeste do Brasil?

Bom, a primeira resposta que me vem a cabeça foi porque queria viajar mais uma vez de bike e há tempos não visitava minha irmã que mora em Rondonópolis-MT.

A segunda é porque tenho uma ligação forte com o interior de SP e adoro o clima, os cheiros e as paisagens da região.

A terceira foram as misturas de várias outras variantes que com certeza iriam me levar a viajar mais uma vez pelo litoral (que também adoro) mas já tinha uma no currículo e queria algo diferente.

Então concluí, por quê não?

Seria uma viagem pelo noroeste paulista, passando pelo Mato Grosso do Sul e entraria no Mato Grosso.

Comecei com as pesquisas básicas e não encontrei quase nenhuma informação sobre alguém que tinha feito este trajeto. Só um ciclista que tinha passado perto mas que tinha uma pegada diferente da minha no qual privilegiava o rendimento diário e eu já sabia que essa não era minha praia.

Pela quantidade de dias que eu tinha de férias (17 no total) comecei a fazer os planejamentos e não teria tempo se quisesse sair de São Paulo e chegar em Rondonópolis distante cerca de 1330km.

Tá, se fizesse 80km por dia daria tempo mas queria passar uns dias com minha irmã e tem o tempo de retorno (pelo menos 24hs de ônibus) e também tem que pensar nos dias de descanso e em alguma eventualidade então essa média aumentaria bastante.

Optei pela facilidade de ter minha mãe que mora em São José do Rio Preto, assim seriam menos 450km.

Mesmo assim também não batia com a média de km que eu queria e já tinha aprendido com a viagem ao Chile que ter uma folga não me deixaria estressado.

Decidi então começar de Votuporanga-SP.

Segundo passo, como chegar até lá?

Poderia ir de ônibus e ficar na casa de uma tia mas mantive a ideia de ir até a casa da minha mãe, quem é sempre uma boa ideia visitar, e no dia da partida meu irmão me levaria até Votuporanga.

Minha mulher estava viajando a trabalho nessa data então convoquei meu sobrinho pra me levar até Rio Preto e assim poderia ir com meu carro e ele traria meu carro de volta pra São Paulo evitando assim o estresse de ir até a rodoviária carregando todo o equipamento.

Saímos então na sexta-feira com destino a Rio Preto, pegamos um belo congestionamento na estrada em virtude de dois acidentes e chegamos de madrugada na casa da minha mãe.

No sábado preparei a bike e curtimos um belo churrasco.

No domingo de manhã saí com meu irmão em direção a Votuporanga.

sábado, 12 de abril de 2014

Cicloturismo pelo Chile e Argentina - 16°, 17° e 18° Dias

O ônibus sairia a tarde então tinha a manhã livre.

Estava com bastante bagagem e a caminhada até a rodoviária era um pouco longa e carregar tudo de uma vez seria complicado.

Tinha visto um guarda-volumes na rodoviária e decidi levar primeiro a bike e deixá-la lá até a hora da partida e não tive problemas porque carrinho ajudou bastante.

Saí então pra dar a última volta pela cidade.



E foi então que vi que não valeria a pena fazer o passeio do bondinho por causa do clima mas ainda consegui boas fotos.




E por falar em foto esta abaixo foi a última.


Andei até um shopping e queria aproveitar pra comer um belo bife de chorizo mas, mais uma vez a única lanchonete que encontrei que aceitava o cartão de crédito era o Mc Donalds.

Voltei ao Hostal, peguei o resto da minha bagagem e rumei para a rodoviária.

Peguei a bike e fiquei sentado esperando chegar a hora de embarcar. Na minha frente uma pequena tela que funcionava com moedas por determinados períodos dependendo da quantia que você coloca na mesma e você pode escolher o canal que desejar.

Escolhi um canal de esportes e percebi que o homem sentado ao meu lado espichava o olho pra aproveitar as imagens que minhas moedinhas proporcionavam.

Chegou a hora do embarque e pra quem viaja de bike é sempre uma hora tensa porque nunca se sabe o que esperar e desta vez eu tinha razão pra me preocupar.

E eu havia perguntado para o cara no guichê se teria problemas pra embarcar com uma bicicleta e eles sempre dizem que não, afinal são apenas vendedores que não se preocupam com o que acontece dali pra frente.

O ônibus de dois andares que já conhecia do Chile tinha o mesmo restrito espaço para as bagagens e estava lotado de turistas estrangeiros que se dirigiam para as cataratas na fronteira do Brasil com a Argentina.

O primeiro contato com o motorista foi o pior possível. Logo de cara ele disse: Não dá. Tem que ser despachado por transportadora.

Argumentei, supliquei e ele mandou eu ir falar com o carregador. Este também não estava muito disposto a me ajudar e foi falar com outra pessoa e voltou falando que eu tinha que pagar, coisa de 20 pesos pelo que me lembro. Tudo bem eu disse e entreguei o dinheiro pra ele e a bike foi colocada no bagageiro.

Entrei no ônibus, subi a escadinha e localizei minha poltrona. Alguns minutos depois olhei pela janela e vi a bicicleta pra fora do bagageiro.

Fui falar com o carregador e ele me devolveu o dinheiro falando que não seria possível...

Mais um tempo de conversa que já envolvia mais umas três pessoas e o dinheiro foi pra uma delas e o embarque foi autorizado e a bicicleta foi colocada no bagageiro novamente.

Fiquei ali até que todas as bagagens dos passageiros, que não eram poucas porque a maioria das pessoas que fazem este percurso são europeus com suas enormes mochilas cargueiras, fossem carregadas e o ônibus se prepara-se para partir.

A boa notícia é que eu não teria ninguém ao meu lado enquanto o resto do ônibus estava lotado.

Agora estava tudo bem e a longa viagem começava.

Reconhecia algumas coisas como o monumento a virgem desnuda citada pelo blog do Arthur.




17° Dia

Sinto muita dificuldade em dormir nesses ônibus de viagem e dessa vez não foi diferente.

Seguia acompanhando as placas da estrada com os mapas que eu tinha pra tentar me localizar e calcular o tempo que duraria o resto da viagem.

A paisagem realmente é bem parecida com as que eu conhecia pelas viagens pelo Brasil e me sentia reconfortado em ter decido acabar com a viagem de bike.

A única visão que chamou a minha atenção foi um curral com uma imensa boiada, muito maior do que todas as que eu já tinha visto e olha que já tive a oportunidade ver e até tocar algumas.

Como sempre estas longas viagens de ônibus tem seus atrasos de 2, 3 ou 4 horas do prazo e isso causava agonia quando o ônibus estava parado sem motivo aparente.

Finalmente chegamos a Puerto Iguazu.

Agora, como chegar ao Brasil?

Felizmente numa cabine de táxis ví os preços para as corridas até Foz do Iguaçú então num deles embarquei.

Ao chegar na fronteira é feito o trâmite de entrada de dentro do táxi mesmo e assim que deixamos a cabine, que mais parecia uma cabine de pedágio, um policial federal ali parado me questionou se a bike que estava no banco de trás havia sido comprada na Argentina e eu apenas respondi que era minha e que estava voltando de uma viagem de bicicleta e ele sinalizou para prosseguirmos.

Desci então na rodoviária de Foz e paguei a corrida com os restos dos Pesos e alguns Reais que eu tinha em mãos.

Fui então comprar a passagem para São Paulo e sempre tentava me certificar que não teria problema mas desta vez estava mais tranquilo porque, como sabemos, este trajeto traz os muambeiros do Paraguai.

Comi um belo PF (não, não é um Policial Federal bonito não!) com arroz, feijão, fritas e bife a cavalo.

Aguardei algumas várias horas pra partida até a hora do embarque.

Como esperado não tive problemas com a bike, apenas pesaram a caixa, mas o motorista não queria me deixar subir por causa das duas mochilas e tive que mostrar pra ele que uma só tinha blusas e roupas de frio e ele me deixou subir.

O ônibus saiu da rodoviária e eu sentia tranquilo porque o ônibus estava praticamente vazio mas esta situação se modificou na primeira cidade que o ônibus fez uma parada.

Os muambeiros, ou pelo menos a maioria deles, não sobem em Foz do Iguaçu tentando fugir de alguma fiscalização.

Ônibus lotado com aquelas pessoas educadas e silenciosas que eu tinha me acostumado deram espaço aos mal educados e barulhentos muambeiros que parecem já estarem vendendo seus produtos aos gritos na Rua 25 de Março.

Ao sair da rodoviária um clima tenso tomou conta dos muambeiros que temiam alguma fiscalização a frente e esta preocupação realmente fazia sentido pois fomos parados no meio da estrada.

Alguns passageiros foram chamados e depois de uns 20 minutos o ônibus foi liberado e as reclamações dos prejuízos causados pelas propinas (desta vez a velha e não tão boa propina brasileira diferente da que tive que pagar no Chile) dadas aos policiais foram o assunto que adentraram pela madrugada.




Dia 18

O trânsito pra entrar na cidade de São Paulo eram os cumprimentos que me traziam de volta pra realidade.

Desembarquei no terminal da Barra Funda, entrei novamente num táxi e o desejo de um banho que não tomava a dois dias, era quase tão grande quanto a vontade de reencontrar com minha casa e minha esposa.

E assim terminou de vez todo o planejamento de 1 ano e meio de estudos de mapas, procura de equipamentos, documentos, vacinas e levantamento de verbas e que sinceramente valeram cada segundo deste trabalho despendido.

As lembranças desta aventura quase que diariamente voltam a minha mente chegando a me arrepiar e me dar forças pra encarar outros desafios.

Não me arrependo de nada mas se fizesse novamente mudaria algumas coisas mas só sei disso hoje porque me lancei sem ter medo de errar e provavelmente mudaria novamente no final desta afinal a vida é uma junção de aprendizados.