quarta-feira, 31 de julho de 2013

Cicloturismo pelo Chile e Argentina - O começo

Depois de tanto tempo com os preparativos não via a hora de pedalar mas ainda tinha uma longa viagem antes que isso fosse possível.

Ansioso não consegui tomar café da manhã. 

Carregado cheguei no aeroporto com ajuda do meu primo pra pegar o voo com destino à Santiago do Chile. Minha bagagem consistia em uma caixa de bicicleta que coloquei alguns itens de camping, uma mochila nas costas que era uma das partes do alforje que se converte em mochila de ataque e a levaria na cabine do avião e mais uma mala de lona grande que comprei baratinho na praça da Sé.

Não fosse o excesso de bagagem que tive que pagar, todo o check-in foi muito tranquilo.

Voo tranquilo e cheguei em Santiago. Fiz o trâmite de entrada e eles me entregaram uma papeleta que você tem que guardar com você até o dia de sair do país. 

Aguardando a chegada da minha bagagem lá vem a mala na esteira mas nada da bike até que uma portinha lateral se abre e um funcionário traz a caixa com minha bike.

Antes de sair tive que colocar a caixa pra passar no raio x e a funcionária se espanta: Una bicicleta!! E tive que mostrar a nota fiscal da bicicleta para o funcionário da aduana pra ter minha passagem liberada. Realmente não sei o que aconteceria caso não tivesse a nota, mas ainda bem que a levei.

Tudo de volta pro carrinho e tinha em mente pegar um micro-ônibus em um andar superior e quando saí do desembarque fui rodeado pelos taxistas não credenciados que me convenceram a usar o serviço falando que o micro-ônibus demoraria pra chegar na rodoviária e eu não queria perder o ônibus que sairia às 14h.

E lá fomos pra rodoviária, eram duas e eu sabia qual era mas o motorista disse que mudou e me deixou em outra. O preço da corrida já estava fechado então aceitei.

Lá comecei a carregar todo o equipamento, como já previa isto tinha feito uma alça na caixa da bike que facilitou o trabalho.

No guichê da Tur-bus tinha "dois tipos de ônibus" o semi-cama e o premium que saiam no mesmo horário e o preço era mais barato que eu tinha visto mas isto é uma prática comum. É uma promoção para dias com menor movimento, então escolhi o premium que na verdade é leito.

Aí o primeiro problema, não era naquela rodoviária... mas eles tinham uma van que fazia a ligação com a outra rodoviária.

Chegando na rodoviária correta já desembarcamos na plataforma.

Segundo problema, o ônibus que eu imaginava ser apenas leito na verdade é um ônibus de dois andares, semi-cama na parte de cima e premium embaixo, por isso "os dois" saiam no mesmo horário. E qual o problema? Onde eu imaginava que seria o lugar pra bagagem na parte de baixo não existia e este espaço fica restrito a uma pequena parte na traseira e aí o problema era sério... o motorista não queria levar a caixa da minha bicicleta que ocupava boa parte do bagageiro e dizia que tinha que mandar por transportadora.

Com muita conversa e uma propina, que não é a propina que nossos políticos estão acostumados, e sim simplesmente uma caixinha consegui embarcar mas acredito que foi porque o ônibus estava praticamente vazio.

Começou então uma viagem de 18 horas com destino a Antofagasta onde começaria a pedalar.

O ônibus é muito bom, a estrada é boa e ainda é servido um lanchinho porém eu não conseguia comer aquelas bolachinhas secas com suco de pêssego e pêssego em calda. 

O ônibus não faz paradas em lanchonetes como estamos acostumados, apenas uma tiazinha no começo da viagem, que vendia chipas na beira da estrada subiu no ônibus e ofereceu seus pães. Eu não sabia como funcionava e não comprei nada.


Logo o ônibus começa a acompanhar o litoral e a viagem se torna bem agradável.



Ao anoitecer a versão masculina de aeromoça da estrada, o rodomoço, vem preparar a cama e servir mais um lanchinho que mais uma vez tinha como ingrediente algumas variações de pêssegos... agora entendo porque eles gostam tanto da nossa variedade de frutas.

Dormi razoavelmente bem e ao acordar a paisagem tinha mudado radicalmente. Me veio a constatação e a ficha caiu: O deserto era realmente deserto (dânn)... Ao invés do mar e uma vegetação rasteira mas ainda verde a paisagem era completamente bege, não como o deserto do Saara cheio de dunas lisas de areia, mas uma paisagem com morros e muitas pedras.

A primeira imagem que tive foi a da Mão de Deus ou como descobri depois a Mano del Desierto, uma escultura feita no meio do deserto e era a única estrutura que se via, fora os postes de energia. Tomei como um bom presságio, ser abençoado pela mão de Deus.

Cerca de uma hora depois chegamos em Antofagasta.

Era de manhã e a rodoviária estava praticamente vazia a não ser por um tiozinho que ficou alí me observando enquanto eu abria as malas e a caixa e começava a montagem da bicicleta.

Tudo montado, dei a mala de lona pra um senhor que fazia a limpeza já que seria apenas um peso a mais e também tinha custado muito pouco.

Agora era só sair da rodoviária e pedalar mas estava no segundo andar e a escada não comportava a bicicleta na curva, fui então falar com uma segurança para sair por onde o ônibus tinha entrado e ela disse que não era permitido e indicou o elevador que tão pouco cabia a bicicleta. Acenei para ela e mostrei que também não era possível e ela então liberou minha passagem.

Senti então o peso da bicicleta e agora sim a viagem começava.











sexta-feira, 26 de julho de 2013

Cicloturismo pelo Chile e Argentina - Preparativos

Preparativos

A Bicicleta:

Já tinha uma bicicleta mas era uma GTS S3 Full Suspension e sabia que não era uma bike pra cicloturismo mas que tinha bons componentes Shimano Alívio que era o mais recomendado nas palestras que já tinha assistido, pela sua resistência e simplicidade.

Então, teoricamente, me faltava apenas o quadro que deveria ficar na casa dos R$400,00 e seria bem fácil de encontrar.

Fui então atrás do componente que por ler em vários sites, principalmente o do Clube de Cicloturismo, sabia que seria o mais difícil de encontrar, o bagageiro dianteiro.

A primeira loja que fui procurar o bagageiro foi a de um conhecido cicloturista que de cara senti extrema arrogância pois quando contei que queria gastar no máximo R$1.000,00 pra montar a bike ele me disse: Você quer fazer cicloturismo ou pagar promessa??

Fiquei extremamente chateado, não tinha a menor condição de gastar mais que isso e ele também poderia ter sido menos grosseiro na forma de dizer isso... É como minha mulher sempre me fala: Existem formas e formas de dizer a mesma coisa.

Continuei pesquisando o roteiro, passagens aéreas, barraca, altitudes, artigos de cozinha, comidas, roupas, remédios, vacinas, outros equipamentos e também a bicicleta.

E fui percebendo que o que eu tinha escutado realmente fazia sentido, mas, mais uma vez, bastava ele ter me questionado de outra forma pra eu entender.

Os meses foram passando e fui conversar com o Zé da Scatt Bikes que eu já era cliente há alguns anos e ele me falou da Sundown que tinha boas bikes na linha Team.

Eu torcia o nariz só de ouvir o nome Sundown por causa da Brisk que era uma bike Full que só de olhar parecia que ia entortar inteira e também por ser uma marca nacional.

Mas eu era novato no reconhecimento e diferenciação de bikes, equipamentos e marcas.

Pesquisando aprendi que o que faz uma bike são os componentes e a linha Team tinha ótimas opções que começava com a 3000 (com câmbios Acera), a 4000 (Alívio) e a 5000 (Deore).

Depois de encher muito o saco do Zé, consegui um bom preço e um parcelamento camarada e abracei a Team 5000.

Agora já tinha a bike

O que me chamou atenção nessa bike foi o excelente custo X benefício pois um Kit Deore saia por uns R$1.200,00, a suspensão dianteira Rock Shox Dart 3 mais uns R$1.300,00, só aí já dava mais do preço que paguei na bike inteira, já vinha com pedal que podia ser utilizado com ou sem sapatilha e também tinha furação para duas caramanholas e para o bagageiro traseiro.

Menos um problema.

O Bagageiro dianteiro - Um item complicado

Pesquisei, pesquisei e pesquisei e na época só tinham uns bagageiros sem vergonha e mesmo assim necessitavam de furação na suspensão dianteira.

Eu tinha um destes que servia perfeitamente na suspensão que veio na minha Caloi SK21 porém, na Sundown não tinha nem a furação próximo das blocagens da suspensão e muito menos no meio da ferradura da parte superior.




Em sites gringos existiam enormes variedades mas aqui, nada... hoje existem algumas opções como pude encontrar no site da Monster Bike mas ainda assim com preço nada convidativo.

Solução? Fabricar meu próprio bagageiro, eu não né, porque não sei usar estas soldas e muito menos tenho máquina de solda.




Nessas horas você procura serralheira e não encontra uma, hoje vejo várias por aí... mas tinha uma no caminho do meu serviço. Parei nela e eles disseram que não faziam este tipo de serviço mas pelo menos me venderam 1 metro de vergalhão liso de uns 5 mm que eu poderia utilizar.

Encontrei um serralheiro próximo de casa que se propôs a fazer o serviço por R$60,00, caro mas era o que tinha pro dia.

Passei o desenho pra ele e menos um problema na lista.

Juntei o bagageiro que comprei mais o que mandei fazer e ficou assim:




Bagageiro traseiro - Fácil de achar mas difícil escolher

Também lí muito sobre as opções de bagageiros traseiros e o que mais chamou minha atenção foi um Tranz-X que tinha muitas criticas sobre sua fragilidade mas também bons comentários. Resolvi arriscar.


Alforjes (Já ví com j mas muitos escrevem com g, mas acho que o correto é escrever com J)

Os alforjes traseiros eu sonhava com os Ortlieb:



Mas eu já tinha os Curtlo e é com eles que vou.

Na região do Brás comprei uns pedaços de lona impermeável e mandei fazer as capas para os alforges e pra bolsa que iria presa no guidão.

Os alforjes dianteiros - Outra via sacra

Já não preciso dizer que procurei, procurei e procurei né??

No fim, não adiantou nada tanta pesquisa e fiz uma escolha que depois me arrependi mas já tinha comprado que foram os da Solid Sound que fabrica cases para instrumentos musicais e se meteram a fazer alforjes também.

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Vale contar a celeuma da compra desse alforje.

No site tinha o grande e o pequeno, por estar precisando do dianteiro escolhi o pequeno.

Chegou... o grande! Liguei pra Solid e eles se prontificaram a trocar mas disseram que eu poderia ficar com o grande que era mais caro, mas ficava muito grande, mandei de volta.

Recebi os pequenos mas os bolsos de fora simplesmente não tinham o carrinho que faz o ziper abrir e fechar, ou seja, tinha o bolso mas não conseguia abrir... mandei de volta novamente.

Voltou, mas o serviço de correção foi uma gambiarra. Nessa altura já estava tão P da vida que fiquei com eles.

Barraca

Eu já tinha uma barraca para 3 pessoas modelo Iglu parecida com essa:


Mas eu estava sempre racionalizando o peso dos equipamentos e resolvi comprar a menor barraca que encontrasse e num golpe de sorte andando pela Rua Florêncio de Abreu que concentra algumas lojas de Camping, caça e pesca encontrei uma pra uma pessoa, e o melhor, na metade do preço que eu já tinha visto em outros sites:


Mais uma escolha errada (em partes) mas este processo de erro e acerto faz parte do aprimoramento do meu estilo de viagem.

Por que escolha errada?

Principalmente porque ela não é auto-sustentável... eventualmente você pode precisar montar a barraca em locais que você não consegue fincar os pinos no chão como em áreas de cimento. Mas isso não aconteceu comigo.

E depois ela se mostrou pequena demais mas até que me serviu bem.

Itens de camping

Encontrei na Mar e Sol que fica no bairro da Saúde, vários itens que eu procurava como os pratos com talheres de plástico de boa qualidade, panela, saco de dormir, toalha super-absorvente, um fogareiro a álcool compacto (não presta!) e cobertor de emergência (aqueles de alumínio que os bombeiros utilizam).

Outros equipamentos como luvas, porta-passaporte, corrente pra bike, travesseiro inflável, colchonete e abridor de latas dobrável foram na Decathlon.

Vistos, documentos, vacinas e remédios

Chile, Argentina e Paraguai não exigem visto e podem ser acessados com RG desde que este tenha até 10 anos de expedição... tive que atualizar o meu.

Vacinas também não são exigidas mas em virtude da característica da viagem resolvi atualizar minha anti-tetânica.

Nos remédios fiz uma farmacinha equipada de anti-inflamatório, relaxante muscular, remédio pra diarreia, enjoo, kit de primeiros socorros, hipoglos, manteiga de cacau (foi a única coisa que usei muito!), repelente, lenços umedecidos e protetor solar (que não são bem remédios mas comprei na farmácia, então ficaram todos juntos) e também um frasco de Hidrostéril.

Cicloturismo pelo Chile e Argentina - A idéia

Por que pro Chile é o que sempre me perguntam.

No ano de 2007 eu estava acompanhando o blog Pedal na Estrada do Arthur Simões e quando ele contou sobre a passagem da Argentina pro Chile e achei fantástico um lugar tão diferente, tão desafiador e tão próximo do Brasil.

Achava que nesse roteiro conseguiria realizar tudo o que eu sonhava sobre andar de bicicleta, pra ver o que tinha após a próxima curva ou morro e uma forma de conhecer o famoso Deserto do Atacama e a Cordilheira dos Andes.

Comecei então os preparativos que levaram 1 ano e meio, preciso dizer que nem a bicicleta eu tinha.

No início pensava em fazer o mesmo percurso descrito no blog do Arthur que passava pelo Paraguai, cruzava a Argentina e seguia para o Chile.

Fiz todo o levantamento e com base na disponibilidade de dias que eu tinha e por isso teria que começar a viagem por Foz do Iguaçu. Os dias seriam suficientes desde que eu seguisse a risca o cronograma (aqui vale uma observação que vou fazer mais abaixo) mas a logística se mostrou tão complicada que poucas semanas antes de começar a viagem resolvi inverter o roteiro, começando assim pelo Chile.

Tinha também a conveniência de fazer a parte mais legal da viagem logo no início, o que se mostrou uma escolha correta já que era realmente a parte que eu queria conhecer.

Cumprir a risca um cronograma em uma viagem inicialmente estimada em mais de 1800Km é realmente um risco... Por mais minucioso que seja a preparação, qualquer imprevisto que aconteça (e tinha consciência que eles aconteceriam) pode causar frustração, ansiedade ou stress e no desenrolar da viagem mudei várias vezes de estratégia. Afinal eu estava lá pra curtir a viagem e não pra me estressar ou ficar encanado com o cronograma mas seria o que teria pra me basear.

Sozinho?  É normalmente a segunda pergunta que respondo.

Busquei companhia no fórum do Clube de Cicloturismo e encontrei uma pessoa disposta a encarar a viagem porém ela acabou desistindo sem dar muitos detalhes.

Aí entram vários fatores.

Cicloturismo em grupo (ou apenas em dois) tem o lado bom e obviamente o ruim.

Lado bom: Você tem ajuda seja em caso de acidente, ou pra dividir o peso das ferramentas, comida e etc. ou pra alguém tomar conta da bike enquanto você vai ao banheiro, ou procura uma pousada, ou simplesmente para conversar.

Lado ruim: Você tem que estar disposto a ceder em razão do grupo, podem existir muitas idéias conflitantes. Você pode encontrar estadia ou carona fácil pra um mas, difícil pra dois. Quando você chega em algum lugar pedalando sozinho as pessoas ficam mais abertas a te ajudar (pelo menos eu sinto isto). Você tem que pedalar no ritmo do grupo ou o grupo no seu ritmo.

Em uma viagem longa quem vai com você tem que ter a mesma disponibilidade e eu não tinha muita flexibilidade na data.

Também tem a questão da empatia. Eu acho que você deve conhecer bem que será seu parceiro tanto na questão do preparo físico quanto da forma de pensar.

Terceira pergunta: Não ficou com medo?

Receio do novo a maioria de nós temos e eu queria vencer alguns deles.

Tinha lido um livro de uma senhora francesa de uns 60 anos que atravessou a Amazônia sozinha em 1973, acho que nem existia o termo cicloturista nesta época, e se ela conseguiu, por que eu não?

Sobre medo de assalto eu penso que moro em São Paulo e apesar de andar esperto pode acontecer a qualquer momento em qualquer esquina. 

Me sinto mais seguro na estrada que na cidade. Não imagino um fulaninho sentado na beira da estrada esperando um cicloturista que pode ou não passar algum dia, apesar de saber que isto acontece muito aqui no Brasil, por isso que a maioria dos cicloturistas gringos que encontrei no Chile e na Argentina nem pensavam em passar por aqui.

Sua mulher não achou ruim? Nem sempre é a quarta pergunta mas ela sempre aparece.

Tenho a sorte de ser casado com a melhor mulher do mundo e não estou dizendo isto pra ela deixar eu ir, porque eu já fui e com apoio dela, que mesmo preocupada com o que poderia me acontecer e sem saber como poderia me ajudar, me incentivou a realizar meu sonho.

Sem a aprovação dela pode até ser que eu fosse mesmo assim mas, isto custaria muito seria muito mais difícil.

Aqui entra também a família e essa eu deixei de fora, só ficaram sabendo quando eu voltei mesmo. Mesmo com este segredo já tinha gente demais falando que eu era louco.

Gastou muito? Outra que nunca falha.

Gastei mais com a aquisição da bicicleta e com os equipamentos (que são muitos e sobrevivem para as próximas viagens) mas, na viagem em sí, não. 

A passagem pra Santiago eu consegui com as milhas que eu tinha na TAM, estava levando a barraca e também comia coisas simples que eu mesmo podia cozinhar.

Gastei com os os ônibus que peguei e com os passeios em San Pedro de Atacama.

Realmente viajar de bicicleta é o meio mais barato que pode existir (não, a pé não ganha porque você demora muito mais).

Quantos quilos de bagagem? Estas próximas perguntas são pros mais interessados.

45kg, sem contar a água que em média eram mais 4 litros sendo que chegou a 8 litros para a parte mais inóspita do percurso. Depois ví que levei muita coisa sem necessidade mas, vivendo e aprendendo.

Levou GPS? A resposta poderia ser uma pergunta: Quê?

Só um Ipod mesmo, nem celular, mas senti necessidade de um despertador.

Quantos dias e quilômetros? Essa é relativa.

Pelo que parei pra contar até hoje foram 18 dias, sendo que não pedalei todos os dias, pra fazer 800km.

terça-feira, 23 de julho de 2013

Minha primeira aventura como cicloturista

O texto abaixo foi a primeira versão que escrevi sobre a viagem no ano de 2004 e resolvi manter muitas coisas porque reflete bem o que eu sabia e sentia na época.
A qualidade das fotos não é boa porque as máquinas digitais estavam apenas entrando no mercado brasileiro.



Foi tudo muito rápido, em 15 dias consegui tirar férias no serviço, mandei a bike para uma revisão e colocação de bagageiro e o alforge e escolhi um roteiro (Litoral Norte de Sampa até Ilha Grande no Rio), veja, escolhi apenas a direção e alguns pontos que gostaria de conhecer, mas não procurei local para hospedagem ou alimentação. Achei que me daria mais liberdade ainda.



Estava cerca de dois meses sem pedalar e gostaria de me preparar um pouco indo, como fazia costumeiramente, ao serviço de bike, porém a aquisição do alforge atrasou um pouco então peguei a bicicleta na véspera da viagem.


Procurei na Internet informações sobre o que levar, comer e etc. e descobri vários sites interessantes e em um encontrei uma listagem das coisas que deveria levar e me ajudou muito, pois, com certeza iria esquecer muitas coisas.

Bike pronta - observe que minha bicicleta não é a mais indicada para este tipo de atividade, pois tem amortecedor na traseira, o que não permite um bagageiro fixo como os das bicicletas barra forte, mas encontrei um bagageiro que fica preso apenas no canote do selim, só que sua limitação é de 9KG e eu estava com pelo menos 20Kg de bagagem.





A viagem era de apenas 15 dias, mas é inverno e a previsão do tempo não era nada otimista então me preparei bastante pra não ficar na roubada, mas acabei carregando peso morto pois o Sol brilhou a viagem inteira, maravilha!!

Achei interessante fazer um diário apenas agora pois assim lembraria de toda a viagem. A única coisa que anotei foram as distâncias percorridas, vamos lá:

Domingo 25/07 (Primeiro dia) – Odômetro inicial 93KM
Ansioso, acordei antes do despertador (5:30h), com lágrimas, melhor, suor no rosto saí as 6h rumo ao Jabaquara e como não havia me dado conta os alforges ficavam muito próximos do ciclo do meu pé no pedal e raspava constantemente o que me forçava a pedalar sempre com o meio do pé. 
Minha intenção era descer a Anchieta ou a Imigrantes, esquece, proibido. 
Tentei encontrar informações sobre a Calçada do Lorena que se conecta na Estrada Velha de Santos, e que por sua vez também não é permitida. Enviei e-mail´s pra quem encontrava na Internet e conhecia as manhas do caminho mas não tive retorno. 
Informações que encontrei como o guard-rail do KM42 são raras e pouco esclarecedoras pra quem estava cheio de bagagem.
Uma hora e apenas 10KM depois na rodoviária já esperava algum tipo de hostilidade, mas eu era apenas uma figurinha muito diferente e fui disputado nos guichês das companhias e o único problema foi ter que retirar toda a bagagem tão carinhosamente arrumada na noite anterior.
Na rodoviária de Santos me dirigi para a balsa que fica bem próximo. Aliás, Ailton me desculpe, mas o lugarzinho feio!!!
Perdi a barca que estava aportada, pois não conseguia retirar a carteira da mochila então aprendi a primeira lição: Mantenha um pouco de dinheiro sempre a mão.

No Guarujá me deparei com uma ciclovia, coisa que só vi nas proximidades do Ibirapuera e nem se compara. Seguindo até a praia Enseada resolvi parar em uma barraca de frutas e lá começou a bateria de perguntas que eu iria escutar muitas vezes na viagem inteira – Tá vindo/indo de/prá onde? Mais algumas respostas e curiosidade morta acho que ajudou pois ganhei meia dúzia de bananas.

Passei pela orla bem cuidada e peguei pela primeira vez o que volta a ser a BR-101 ou Rio-Santos (Correção, não é a BR nem Rio Santos) até a Prainha Branca que tem acesso por uma escadinha bem ao lado da balsa para Bertioga. Muita força bruta e venci os degraus e depois a trilha – bom não vai mais ser bem uma trilha, pois o pessoal está calçando com pedras e cimento – que leva a pequena vila e facilmente encontrei uma pousada, acho que era a mais cara da vila (R$20,00).
Curti a praia e me empanturrei com o Festival da Tainha que acontecia na Vila.
Hoje tem jogo do Brasil X Argentina pela final da Copa América. Tomei um banho e saí a caça de uma TV e como não podia deixar de ser no único botequinho da vila encontrei uma. 
Só tinha o dono do “estabelecimento” e pra não ficar chato comprei uma Coca e fiquei confortavelmente sentado naquela cadeirinha de ferro até que começou a chegar toda a (meia-dúzia) comunidade dos pescadores consumidores do local, tive que me levantar. Valeu a pena! Brasil campeão!

Segundo dia – Odômetro inicial do dia 152KM
Acordei cedo e resolvi voltar sem bagagem uns 6KM pra conhecer a praia de Iporanga que eu havia passado no dia anterior, mas não tive coragem de entrar por causa da grande subida de boas-vindas. 
Muito bonita e bem conservada. Também só tem casas de alto-padrão.

De volta para a Prainha. Primeira baixa - descobri que perdi meu óculos de sol, nada que um Vale-Refeição não recupere. 
Bagagem recolocada e novamente força bruta, peguei a Balsa para Bertioga (muito melhor que a de Santos e não cobrou os descabidos 75 centavos).

Seguindo pela Rio-Santos depois de Boracéia resolvi entrar na estradinha de terra para me manter o mais próximo possível da praia, péssima escolha, ao parar para um xixi básico deixei cair um segundo óculos de sol depois de andar 1,5KM tive que retornar ao local. 
O sacolejar da estrada adiantou a provável quebra do bagageiro e os alforges começaram a pegar nos raios - Primeiro problema real. 
Depois da gambiarra (segunda baixa, esqueci o alicate na mureta) eu conseguia andar lentamente o que me atrasou muito e me obrigou a andar pela a noite – Prática totalmente desaconselhada, mas eu contava com um farol e um pisca traseiro que me deram uma certa segurança.

Chegando em Camburi comecei a perguntar pelo Albergue da Juventude e depois de algumas caras que mostravam que eu ainda teria que pedalar bastante, segui a indicação de que encontraria o mesmo no final da estradinha de terra. 
Passei por caminhos que me mostravam que estava na direção errada, mas queria pagar pra ver e no final desta estradinha achei que iria mesmo pagar – Dei de cara com um portão que se iluminava por um salvador sensor de presença e sem nenhuma indicação que era o albergue, muito pelo contrário, alertava a presença de cachorros e foi o que percebi ao me virar e ver que os latidos eram acompanhados de vultos de dois dobermans e um rotveiller que já cercavam o único caminho que eu tinha. 
Mantendo a calma e me movendo apenas para que o sensor reacendesse a luz, resolvi pegar o telefone celular mesmo não acreditando que iria ter sinal mas felizmente eu estava errado e consegui ligar para o albergue e ver que eu havia passado e muito do local mas era a única coisa que eu poderia fazer, ainda restavam os cães, imóvel e me utilizando do meu farol vigiava a movimentação dos meus intimidadores e depois de latir uns 5 minutos eles foram se voltando para o mato de onde saíram – Ufa!! 
Voltei e consegui encontrar o bendito albergue, já eram 22h e eu estava sujo, cansado e com fome.
Felizmente a, muito gente boa, Sofia ao ver meu estado se prontificou a fazer x-tudo que devorei rapidamente. Mais uma noite de sono profundo.

Terceiro dia – Odômetro inicial do dia 252KM
Depois do café da manhã, incluído na diária de R$18.00, fui verificar como poderia aperfeiçoar a “gambiarra” e resolvi redistribuir o peso da bagagem e ganhei assim uma mochila que a partir de agora me faria companhia presa ao guidon.
Mais curiosidade de alguns surfistas hospedados e sigo meu caminho.
Terceira baixa – não percebi que o óculos de sol caiu de cima dos alforges na grama e passei por cima do mesmo transformando-o em uma escultura pós moderna.
Na estradinha tive uma surpresa, um bicho-preguiça, preguiçosamente, ao meu ver, tomava sol no meio da estrada. Parei para tirar uma foto e neste meio tempo surgiu um morador local que já acostumado com o bicho naquela perigosa posição agarrou no cangote da criatura e colocou-o cuidadosamente nos galhos de uma árvore.



Feliz, pois as histórias que teria pra contar se multiplicavam voltei para a BR e ao passar por Boiçucanga me deparei com a temida serra que me levaria para Maresias. 
Ao começar a subir (empurrando) fui alcançado por duas garotas que também passavam o mesmo martírio carregando, entre outras coisas, meia melancia e litros de leite (Mais curiosidades) e me incentivavam a continuar subindo. 
Elas ficaram no meio da subida e eu tinha a pior parte do percurso pela frente.
Sofrimento a parte a descida foi excelente fazendo a adrenalina disparar ao ver o velocímetro marcar rapidamente 72KM/H e tendo que frear pois as curvas chegavam também muito rapidamente.
Quarta baixa - o par de tênis que estava separado para as pedaladas literalmente abriu o bico. Pelo menos diminuiu o peso.
Depois de Maresias o sobe e desce da estrada tornou-se constante fazendo com que neste dia eu ficasse mais tempo empurrando do que pedalando.
Fui ultrapassado por uma ciclista que me cumprimentou no seu percurso de ida e novamente na volta.

Praia de Calhetas com Ilhabela ao fundo a esquerda

Muitas horas e poucos quilômetros depois cheguei a São Sebastião e peguei mais uma vez a balsa que também não cobra nada (de pedestres e ciclistas) até Ilhabela.
Encontrei um Hotel com um preço razoável por ser de frente a praia (R$30,00), ter TV a cabo, ar-condicionado e varanda, mas na noite eu descobriria o porque, os carros que passam entre a praia e o hotel parecem estar passando dentro do quarto.
A noite sai pra comer alguma coisa e passei um certo carão ao ver a cara de espanto do garçom ao perceber que comi sozinho uma pizza inteira.
Tudo bem, novamente cansado e de barriga cheira nem vou ser muito incomodado pelos sanguinários borrachudos.

Quarto dia
Dia de realizar um sonho antigo – Trilha para Castelhanos!!!
Sem bagageiro e com uma mochila nas costas saí alucinado para enfrentar os 19KM de ida até o outro lado da Ilha e nem me dei conta que havia esquecido o odômetro no hotel, coisa que não me proporcionou a verificação da velocidade na descida.
Ainda sentia o cansaço e o despreparo e empurrei em grande parte do percurso mas na alucinante descida parei umas duas vezes pra descansar os dedos nos freios que tinham que segurar a bike pra eu não desbarrancar morro abaixo.
Deixei a bike num dos bares da praia e fui dar uma volta na praia prometendo ao garçom que comeria alguma coisa ali na volta e levei uma Coca.
Tinha intenção de ir a cachoeira na trilha no canto esquerdo da praia, mas preferi me poupar para a volta e já conhecia a mesma. Mas pra quem não conhece eu realmente recomendo.
De bobeira na areia lembrei que não havia pegado dinheiro, a sorte foi que do dinheiro que deixei a mão havia algumas moedas que pagaram justamente a coca e me fez explicar a situação para o garçom que já preparava uma mesa ao me ver retornar.
Repeti o procedimento que fiz para vir e cheguei ao hotel com a feliz sensação de sonho realizado.

Quinto dia
Folga!! Pedalei apenas 22KM para ir e voltar da praia do Curral onde passei o dia estirado na areia.

Sexto dia – Odômetro inicial do dia 301KM
Na maratona de refazer a gambiarra no bagageiro e colocar os alforges conheci um Senhor no corredor do hotel que com um português misturado com espanhol veio conversar comigo e contar que também era cicloturista e nesta viagem atual havia pedalado 9000KM em 9 meses pela Argentina e Chile, mas que também já havia cruzado a África.
A bicicleta dele, uma Koga-Miyanta (até então eu nunca tinha ouvido falar nesta marca), a primeira vista não tem nada de diferente das conhecidas Barra-Forte além do bagageiro dianteiro e protetor dos raios da roda dianteira que indica a grande possibilidade de carga da mesma.
Conversamos rapidamente, pois eu tinha um longo caminho e ele iria para Castelhanos, até que iria gostar de saber mais destas aventuras.
Seguindo por Caraguá não tive muitas dificuldades nesta parte do caminho e próximo Ubatuba fui alcançado por um cara de bike que queria matar sua curiosidade e para minha surpresa o mesmo lembrava muito um amigo meu só que engraçadamente era loiro. Muito gente boa e curiosidades a parte ele me guiou por algumas pousadas até que eu me estabelecesse.

Sétimo dia – Odômetro inicial do dia 409KM
Quinta baixa – esqueci uma bermuda na pousada e na mesma meu RG e as chaves dos cadeados.
Saindo de Ubatuba seguia com Sol na cabeça e a maior dificuldade foi a subida que marca a divisa dos Estados de São Paulo e Rio. 
Antes da mesma fui ultrapassado por um casal de ciclistas que surgiram do nada. Estas aparições dão um certo susto quando subitamente você ouve um Olá na sua orelha. 
Pouco a frente fui alcançado por outro ciclista que me acompanhou enquanto queria matar sua curiosidade e me dar umas palavras de apoio. 
Depois de poucos quilômetros o mesmo tomou o caminho contrário retornando a Ubatuba. Encontrei novamente o casal desta vez retornando que me cumprimentaram com o mesmo entusiasmo da ida.
Chegando na entrada para Trindade me preparei para a cansativa ladeira a frente e depois de uma hora e 3KM depois cheguei ao topo e me deliciei com a instigante descida que convida a deixar a bike acelerar até desenvolver grandes velocidades. Preferi manter a cautela.
Estabelecido em Trindade comi o que seria a segunda refeição de verdade com arroz, feijão e um bife delicioso por R$6,00.
A noite fui premiado com um acontecimento astrológico daqueles que acontecem a cada centenas de anos e que trouxe a Lua para o ponto mais próximo da Terra e não tinha uma nuvem no céu. Andei pela praia sem precisar fazer uso do meu farol-lanterna e fiquei durante horas apreciando este espetáculo.

Oitavo dia
Fiquei em Trindade e fui fazer um trekking para conhecer a “Pedra que engole”, para minha sorte haviam algumas crianças brincado no local e me mostraram o porque deste nome deitando no leito do rio sobre uma pedra e deixando-se escorregar para dentro dela saindo risonhamente do outro lado da mesma.
Curti um pouco a praia e fui dormir cedo.

Nono dia – Odômetro inicial do dia 484KM
Dia do percurso mais curto, cerca de 24KM até Parati, mas ainda tinha que vencer novamente a grande subida. Novamente 1 hora e 4Km depois cheguei ao topo e me preparei para a descida. Quando fiz o caminho inverso percebi que logo no inicio eu poderia deixar a bike acelerar e foi o que fiz chegando a impressionantes 77KM/H com uma bike totalmente carregada e em dois minutos depois eu chegava novamente a BR101.
Percurso fácil até Paraty onde me estabeleci no Albergue da Juventude e sai para conhecer alguma coisa a mais da cidade.
Ao retornar uma surpresa, o Senhor que conheci em Ilhabela também se hospedou no Albergue mas quase não conversamos neste dia.

Décimo dia – Odômetro inicial do dia 509KM
Comecei a me preparar para meu percurso mais longo e o Senhor também fazendo o mesmo e descobri que iríamos para o mesmo lugar (Angra dos Reis), porém ele não se mostrou muito interessado em ter acompanhante, o que eu também não queria pois imaginava que o ritmo dele seria mais forte que o meu apesar de sua idade e também porque eu queria fazer o passeio sem me prender em alguém.
O Senhor, que agora sabia seu nome – Josef, saiu e uns 10min. depois foi minha vez.
Alguns quilômetros a frente percebi a bicicleta de Josef parada no lado oposto da estrada, aparentemente ele estava no bar que havia ali. 
Prossegui depois de um tempo fui alcançado por Josef e passamos a andar por um tempo juntos até que ele parou para comer e eu resolvi prosseguir.
Cerca de 500 metros antes da Usina Nuclear começou a cair uma chuva fina que me obrigou a parar e me preparar para uma chuva mais forte, mas não foi o que aconteceu e 500 metros após a Usina a chuva parou. 
Foi a única vez que peguei chuva.
A uns 15KM antes de Angra fui novamente alcançado por Josef e eu estava cansado, mas resolvi acompanhar o ritmo dele. 
Quase com a língua enrolando na roda Josef resolveu parar e eu não tinha condições de prosseguir naquele ritmo aceitei de imediato. 
Josef percebendo meu sofrimento me ofereceu um drops chamado Dextro Energy e me garantiu que não era nenhuma droga, apenas açúcar de uva que repõe rapidamente a energia e realmente me ajudou nos últimos 5KM. 
Conversando com Josef sobre meu destino ele resolveu me acompanhar até a Ilha Grande e assim pegamos uma escuna que estava saindo para a Ilha. 
A Barca oficial que faz este percurso duas vezes ao dia ao preço de R$4,25 já havia saído por isso pagamos R$10,00 para ir de escuna.
Chegamos na Ilha já a noite e procurando o Albergue da Juventude acabamos indo parar em uma pousada de nome Albergue mas acabamos ficando ali pois o preço estava mais em conta do que no verdadeiro Albergue.
Antes de chegar na pousada Josef me informou que precisava parar em um mercado para fazer algumas compras e para minha surpresa suas compras se resumiram em uma garrafa de 51 que ele secou em um dia e meio. 
Ele é uma figurinha muito rara, com 58 anos, fumando cachimbo e com grande bagagem de conhecimento me contou várias de suas passagens e também como fazia para se virar no dia-a-dia.

Josef

Entre outras coisas me mostrou um tipo de meia que envolvia sua caramanhola e molhada mantinha a mesma gelada devido a evaporação da água e também reparei que seu chinelo tipo papete era da Shimano e funcionava como sapatilha fixando-se ao pedal.
Conversamos sobre o que ele achava do Brasil e que era totalmente diferente a imagem que os europeus tem, de que aqui em todo lugar, a toda hora se encontra gente dançando na rua.
Também percebi sua preocupação com a água que consumia pois perguntava se a mesma era “cozida” (fervida) sempre que não tinha certeza da origem da mesma.

Décimo primeiro dia
Fizemos um passeio de Escuna até a chamada Lagoa Verde onde se vê muitas estrelas do mar e uma água muito bonita.
Não teve pedalada hoje.

Décimo segundo dia
Josef iria para Angra para dar prosseguimento a sua viagem e nos despedimos no cais onde eu fui fazer o único caminho possível de bike que era ir até o outro lado da Ilha.
A estrada lembra muito a de Castelhanos, mas com muitos cacos de azulejos quebrados por todo o percurso. 
Como a calibragem dos meus pneus estava baixa tive o primeiro pneu furado, que consertei rapidamente e terminei meu passeio.



Nos próximos dois dias fiquei na Ilha fazendo trekking para conhecer muitas de suas praias antes de retornar para casa. Vale muito a pena conhecer a Ilha Grande, muito bonita.

Retornei então para o Continente, peguei um ônibus para o Rio em que o motorista me cobrou a bagagem no valor de uma passagem R$10,00 por causa da bicicleta. 
Em cada lugar e/ou companhia existe um procedimento a ser seguido como pagar bagagem, suborno ou ser solicitada a nota fiscal da bike, portanto esteja preparado para tudo.
Na Rodoviária Grande Rio não tive nenhum problema em adquirir a passagem e embarcar no ônibus para Sampa. 
Chegando em São Paulo fui impedido de entrar no Metrô pelo simples motivo de que não é permitida bicicleta, apenas na caixa. 
Bom, meu último pedal até em casa no Cambuci e assim termina minha aventura.
Odômetro Final 610KM

Trazer bicicleta do exterior

Quando eu falo que trouxe minha Giant do exterior muitos ficam espantados e logo perguntam: Mas como? No avião?

Simples, desmontada, na caixa e no compartimento de carga do avião mesmo.

Como foi:

Primeiro todos sabem que Miami é um paraíso de opções, segundo que os preços são bem atrativos, até irresistíveis.

Pesquisei bastante nos sites das lojas de Miami e selecionei as que tinham mais opções. Eu só tinha a intenção que fosse uma Mountain Bike Full Suspension (daquelas que tem suspensão na frente e atrás), se fosse aro 29 seria perfeito, não precisava ser de carbono porque aí extrapolava o quesito orçamento que também estava definido, com uma pequena margem caso a oferta fosse irresistível.

Fiz uma planilha das lojas e um mapa da localização das mesmas pois, como nunca tinha ido pra lá não tinha noção de como era se locomover pela cidade.

Teria dois dias na cidade (e mais um pra perder no aeroporto) porém, eu, único homem, estava acompanhado de 3 mulheres e elas não ficariam felizes em perder um destes preciosos dias em lojas de bicicletas. A escolha correta seria tê-las deixado no Outlet e ido atrás sozinho, mas eu também queria aproveitar as ofertas desses imensos centros de compras pois eu pensava que 2 dias não seriam suficientes, felizmente não sou tão consumista assim e seriam suficientes sim, enfim, fiz a escolha errada e no primeiro dia de manhã fomos todos para a Cycle World Miami.

Chegamos alguns minutos antes da loja abrir e quando abriu vi que era realmente a loja que procurava, tinha de tudo inclusive o mais importante, uma Giant Anthem X4 aro 29, linda e no valor que eu queria pagar!




O Donald (que não pude deixar de associar ao pato) permitiu que eu desse uma volta no estacionamento da loja desde que meu passaporte ficasse com ele (são muito precavidos portanto nunca esqueça de levar seu passaporte nem pra ir na esquina).

Bike definida, só faltava capacete, canivete de ferramentas, sapatilha, Gopro, seus acessórios, luvas, pedais (bike nova e boa nunca inclui pedal!!), pastilhas de freio, ainda esqueci o odômetro e câmbios novos para minhas outras bikes e vários outros itens que deixei de lado visto a imensa pressão que sofria da mulherada que a esta altura já estavam mais que impacientes, algumas delas realmente descontroladas!! Passaria o dia ali fácil!!

Conversei com Donald sobre a possibilidade de fazer uma nota com valor mais baixo por causa dos impostos que teria que pagar pra entrar com a bike no Brasil e ele falou que faria sem problema (lá não é como aqui que deve ser emitida uma Nota Fiscal com número de série que, teoricamente, é acompanhada pela receita), bastava eu falar o valor, que também não poderia ser muito baixo pra não aguçar a curiosidade dos fiscais da Receita Federal. 

Ele ainda se prontificou em "dar uma sujada" na bike pra fingir que era uma bike usada em aluguel e isso justificaria seu preço mais baixo... Não era necessário como vou falar mais abaixo.

A bike ainda teria que ser desmontada e encaixotada então combinei com ele que passaria na loja antes de ir para o aeroporto.

Vamos ao Outlet, mas como o assunto aqui é a bike vou pular essa parte.

Na manhã do dia de ir buscar a bike fui até a loja, que era na direção oposta do hotel e do aeroporto, e congestionamento lá é tão ruim quanto aqui.

Cheguei na loja a caixa já estava prontinha, só aberta pra eu dar uma olhada se estava tudo ok. Confirmei e ele fechou com a maquininha de grampear gigante.

O carro... (com 3 mulheres qualquer carro fica pequeno...) era um SUV da GMC modelo Terrain... até então só tinha a bike, voltei pro hotel e num imenso malabarismo consegui colocar tudo e todas dentro (não cabia literalmente mais uma caixa de KitKat) e partimos pro aeroporto.




Devolvemos o carro, aluguei um carrinho de mão e levei até o ônibus que nos levaria até o terminal. No terminal, outro carrinho e como chegamos cedo já ficamos na fila do check in que a esta altura estava às moscas.

Transportar bicicleta em ônibus, barco ou avião tem sempre um porém... já me pediram nota fiscal da bike, já deixaram eu entrar sem problema, já paguei propina e tinha me informado que algumas companhias aéreas (Gol por exemplo) cobra uma taxa mas não achei nada conclusivo no site da Avianca, só que era permitido.

Estava com 100 dólares separados esperando a tal taxa... a garota pediu pra eu colocar na balança, perguntou o que era e perguntei se tinha que pagar alguma coisa pra transportar bicicleta, ela falou que não e despachou sem problema nenhum, provavelmente porque eu só tinha pra despachar mais uma mala e fiquei dentro da franquia de peso. Respirei aliviado... agora só tinham mais dois problemas, rezar pra bike chegar inteira em Cumbica e passar pela aduana.

Depois de um longo voo com direito a uma escala em Bogotá chegamos a esteira da bagagem... eu não sabia se a bike viria na esteira ou por uma portinha lateral como foi em Santiago... e lá veio a imensa caixa da Giant pela esteira e atraia os olhares de todos que alí estavam esperando suas bagagens... pensei se todo mundo aqui viu, imagina os fiscais...

Também reparei que a caixa foi aberta, não por nenhum dos ratos do aeroporto mas pelo pessoal da TSA (Transport Security Administration) que deixaram uma papeleta informando que a carga foi vistoriada e apesar de não estar faltando nada bem que eles poderiam ter fechado melhor a caixa.

Comprinhas do Dutfree (onde você pode gastar mais U$500,00 sem entrar na cota), e entrei sozinho na fila da fiscalização, já que, já tinha me preparado pra pagar a taxa de importação que funciona assim:

Quando você chega no Brasil de avião (via terrestre a cota é menor) vindo do exterior você pode trazer mercadorias no valor de U$500,00, o que você gastar acima disso você paga 50% do que ultrapassou a cota, ou seja, gastando U$800,00 é taxado os U$300,00 em 50%, você paga U$150,00 de imposto.

Caso você queira dar uma de espertinho e tentar passar sem declarar você pode dar a sorte de não pagar nada de imposto mas se os fiscais te pegam você tem que pagar 100% do excesso mais algumas multas.

Em alguns casos vale realmente correr o risco porque mesmo se você for pego e tiver que pagar os 100% de multa ainda assim fica mais barato do que comprar aqui.

Algumas mercadorias tem taxas diferenciadas como cigarros, bebidas ou livros por exemplo.

Lá estava eu na fila e o fiscal perguntou o que eu estava fazendo alí, respondi que queria pagar o imposto da bicicleta que estava trazendo. Ele então pediu a nota da bike, entreguei a nota que descrevia Bike Giant Demo Sale no valor de U$1300,00 (passei em U$800,00 da cota e teria que pagar U$400,00 de imposto).

O fiscal perguntou o modelo da bike eu disse que era ano 2011 quando na verdade era 2012, então ele saiu com a nota e depois de algum tempo voltou e disse: Vem comigo, não estou encontrando essa bike.

Cheguei na frente de um computador e ele estava no site da Cycle World Miami e ele disse pra eu achar a bike... pensei agora fud...  digitei Giant... apareceram umas 400... digitei Anthen mais umas várias... digitei X4 e apareceu apenas uma, exatamente a mesma só que aro 26 e pra minha sorte com o mesmo valor que estava na nota... ele disse ok, nem olhou a bike e fez os cálculos dos impostos... Fui até uma agencia bancaria que fica aberta 24hs no saguão de desembarque e paguei as taxas, retornei, entreguei o comprovante e uma mocinha fez a documentação legalizando a bike.

Aí você me pergunta, mas você comprou só a bike?? Não, como disse acima tinha câmera filmadora (que você pode trazer 1 sem entrar na cota), capacete, peças, roupas, tênis e etc. Mas como não tinha nada em excesso e resolvi pagar o imposto só fui taxado na bike mesmo.

Saí do desembarque com um sorrisão e minha mulher respirou aliviada pois já achava que eu tinha sido preso.

Cheguei em casa e fiquei surpreso com o cuidado com que a bike foi embalada na Cycle World Miami. Felizmente alguém neste mundo faz as coisas como devem ser feitas o que garantiu que a bike chegasse aqui sem nenhum problema e sem faltar um parafuso.

Moral da estória, entendo que trazer produtos de fora prejudica o mercado interno, causa desemprego e etc, mas pagamos tanto imposto, por toda a vida, que um desconto tão pequenino não prejudica a economia e eu simplesmente não compraria uma bike dessa aqui porque o valor é realmente muito alto!

Vai comprar no Brasil uma bike de R$10.000,00? Dá o dinheiro pra mim que vou buscar pra você uma legalizada e ainda faço um desconto de R$1.000,00.